Inspirado no Ilê Aiyê, jogo de tabuleiro criado por estudantes da Bahia ganha prêmio internacional

Iniciativa de alunas de Ponto Novo nasceu para fortalecer a identidade negra e já é reconhecida como uma poderosa ferramenta de educação antirracista.
Publicado em 13 de outubro de 2025

 

Uma restrição em sala de aula se transformou em uma premiada ferramenta de afirmação cultural no interior da Bahia. Estudantes do Colégio Estadual de Tempo Integral Nelson Maia, na cidade de Ponto Novo, desenvolveram um jogo de tabuleiro inspirado nos 50 anos do bloco afro Ilê Aiyê e acabam de receber um prêmio de Destaque Internacional na categoria História e Antropologia, durante o Encontro Sul-Americano de Ciências e Tecnologia, no Paraguai.

O projeto, que nasceu em meio à proibição do uso de celulares nas escolas, foi criado não apenas como uma atividade pedagógica, mas como uma resposta à necessidade de fortalecer o orgulho e o pertencimento racial entre os jovens.

 

Do documentário à sala de aula: O despertar da identidade

 

Tudo começou quando a professora Noemia Cruz exibiu o documentário Ilê Aiyê: A Casa do Mundo em suas aulas de “Arte e História dos Meus Ancestrais”. Ela percebeu que muitos alunos tinham dificuldade em se autodeclarar como pessoas pretas e desconheciam a profundidade de símbolos da cultura negra, como o próprio Ilê.

A partir das reflexões geradas pelo filme, as estudantes Raquel de Jesus e Alessandra de Jesus, com a orientação da professora, decidiram criar algo que pudesse ensinar e engajar os colegas de forma lúdica. “Me sinto feliz em ter provocado os alunos e apresentado a eles essa riqueza”, comentou a professora Noemia.

 

Um jogo para exaltar e fortalecer a juventude negra

 

Para as criadoras, o projeto tem um significado pessoal e coletivo. O jogo se tornou uma plataforma para dar voz a questões importantes e celebrar a própria história.

“A gente trouxe esse jogo para exaltar e fortalecer a juventude negra, para elevar sua autoestima”, afirmou Alessandra de Jesus. A colega, Raquel, complementou, falando sobre superação: “Para mim foi algo muito significativo, não só por ter saído do país, mas foi significativo para mim, que sofri bullying, poder levar a cultura da Bahia. É representatividade cultural”.

 

Como funciona a jornada pelo legado do Ilê

 

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Foto: André Frutuoso

 

Mais do que uma competição, o jogo é uma experiência de aprendizado coletivo. O objetivo não é simplesmente vencer, mas percorrer um caminho de conhecimento sobre a cultura e a história do povo negro, tendo o legado do primeiro bloco afro do Brasil como guia.

A dinâmica funciona da seguinte forma:

  • Movimentação: Ao invés de dados comuns, os jogadores usam búzios para avançar no tabuleiro, que tem um trajeto em formato de “S”.
  • As Cartas: O baralho possui 50 cartas, em homenagem ao cinquentenário do Ilê Aiyê. Cada uma destaca uma personalidade negra de relevância histórica ou artística, como Mãe Hilda Jitolu, Vovô do Ilê e Margareth Menezes.
  • Os Desafios: Ao pegar uma carta, o jogador responde a uma pergunta sobre a temática negra diaspórica. Se acertar, avança o número de casas indicado. Se errar, passa a vez.
  • O Objetivo Final: A jornada se completa ao chegar à “Senzala do Barro Preto”, a sede do Ilê Aiyê, consolidando o percurso de aprendizado.

Com o sucesso e o reconhecimento internacional, as estudantes e a professora agora planejam criar novas versões do jogo e levá-lo para outras escolas, expandindo o alcance desta poderosa ferramenta de educação antirracista nascida no coração da Bahia.